Moradores deixam para trás casas com móveis e abandonam vila para fugir de facções em Pacatuba, na Grande Fortaleza

  • 02/11/2025
(Foto: Reprodução)
Moradores abandonam vila para fugir de facções em Pacatuba (CE) e lugar fica vazio Uma vila de casas na cidade de Pacatuba, Região Metropolitana de Fortaleza, tornou-se um “território fantasma” após cerca de 30 famílias serem expulsas por facções criminosas. O g1 foi até a vila e encontrou as casas trancadas, muitas ainda com os móveis dentro, mas sem sinal de habitantes. Em muitos muros, pinturas tentavam apagar os símbolos, ainda visíveis, das pichações das facções. A área, conhecida como Jacarezal, foi disputada pelos grupos cariocas Comando Vermelho (CV) e Terceiro Comando Puro (TCP) - este último "herdou" o controle do local do Guardiões do Estado (GDE), grupo de origem cearense. Ao fim, a disputa deixou um cenário de abandono e medo. A expulsão ocorreu em setembro, após uma escalada de conflitos entre facções rivais. O CV tomou o controle da área, antes dominada pela GDE. Em resposta, a GDE se aliou ao TCP, intensificando os confrontos. Tiroteios, ações policiais e o assassinato de um morador que resistiu à ordem de saída culminaram no esvaziamento da vila. ✅ Clique aqui para seguir o canal do g1 Ceará no WhatsApp LEIA TAMBÉM: Vilarejo do Ceará vira 'território-fantasma' após expulsão de moradores por facções Moradores das proximidades relatam viver sob ameaças constantes e restrições de circulação. A ausência de segurança pública é criticada, e há denúncias de abandono por parte das autoridades. Esse tipo de expulsão em massa não é novidade no Ceará. Desde 2015, diversos bairros da capital e do interior enfrentam ações semelhantes. A Defensoria Pública já registrou centenas de casos, embora os dados mais recentes sejam mantidos em sigilo. Especialistas apontam que a localização estratégica da pequena vila de casas em Pacatuba, próxima à CE-060 - que dá acesso a diversas cidades do estado - atrai o interesse das facções. As autoridades afirmam estar atuando na região. A Polícia Militar reforçou o patrulhamento, a Polícia Civil investiga as ameaças, e o Ministério Público acompanha o caso. A Prefeitura de Pacatuba nega ter sido formalmente procurada, mas promete melhorias na segurança. Vila de casas na comunidade Jacarezal, em Pacatuba (CE), ficou vazia após moradores serem expulsos por facção TV Verdes Mares O que aconteceu? 📍Pelo menos 30 famílias foram obrigadas a sair de casa na semana do dia 22 de setembro após ameaças de criminosos em uma pequena vila localizada na região conhecida como Jacarezal, na Avenida Senador Carlos Jereissati, em Pacatuba, no Ceará. O local, que antes abrigava também pequenos estabelecimentos, como barbearia e uma igreja evangélica, agora está abandonado. As portas das casas estão trancadas com cadeados reforçados, animais domésticos caminham pela vila sem rumo, poeira e sujeira tomam conta das calçadas. Imagens de 2024 do Google Street View mostram moradores e negócios abertos no Jacarezal, em Pacatuba (CE) Google Street View Qual o contexto? A comunidade era considerada território da facção GDE há anos e era conhecida por abrigar um ponto de venda de droga. Antes das expulsões, era possível ver pichações em referência à GDE nos arredores da comunidade, com ordens a quem trafegava por lá para baixar os vidros dos carros ou tirar o capacete. No último 9 de setembro, já em meio à disputa de territórios entre a GDE e o Comando Vermelho (CV) em Fortaleza e Região Metropolitana, passaram a circular nas redes sociais imagens de pichações do símbolo CV em algumas casas do Jacarezal. A pintura era um indicativo da disputa do Comando Vermelho para tomar o controle do local e do tráfico de drogas na região, até então predominantemente dominada pela GDE. Em 15 de setembro, o Comando Vermelho comemorou com uma queima de fogos a vitória sobre a GDE no domínio de algumas comunidades de Fortaleza, como o Lagamar. No dia seguinte, 16 de setembro, a GDE e a facção carioca Terceiro Comando Puro (TCP) - rival de longa data do CV no Rio de Janeiro – anunciaram uma fusão no Ceará. Houve também uma queima de fogos em diversas localidades do Ceará. No mesmo dia, as pichações da GDE no Jacarezal já haviam sido sobrepostas pelas do TCP. Queima de fogos registrada em Fortaleza em setembro foi comemoração de facção após conquista de novo território Reprodução Nos dias seguintes, moradores com quem o g1 conversou relataram tiroteios esporádicos nas proximidades do Jacarezal, alguns deles em plena luz do dia. Também foram relatadas intensas movimentações policiais, inclusive com uso de helicópteros. Na madrugada do dia 22 de setembro, um homem foi morto por criminosos no Jacarezal, dentro de casa, supostamente por desobedecer a uma ordem da facção para deixar o local. Três dias depois, a comunidade estava vazia. O que dizem os moradores da região? Ao g1, moradores da região, que não foram identificados por questões de segurança, relatam o clima de medo e mudanças na rotina após o início do conflito. Entrar na 'vila-fantasma', por exemplo, passou a ser proibido pela polícia, diz a população. Alguns dos moradores expulsos já tentaram retornar às suas casas para buscar móveis ou itens pessoais, mas sem sucesso. As vítimas buscaram abrigos em casas de familiares. Apesar do receio em falar do assunto, moradores de Pacatuba cansados do cerceamento imposto pelas facções, fizeram os seguintes relatos ao g1, sob condição de anonimato: "Tem gente que vem pegar suas coisas e não consegue. Agora mesmo um rapaz veio pegar sua geladeira, mas não deu certo. A região está muito perigosa" "Há umas três semanas teve tiroteio aqui. Ninguém entra mais aí dentro (da vila do Jacarezal), porque a polícia não deixa. E aqui, depois das 21h, ninguém mais passa a pé". Facção fez pichações por cima de símbolos de outra facção na comunidade Jacarezal, em Pacatuba (CE) g1 CE "Um amigo do meu pai foi expulso. Disse que eles (os criminosos) chegaram mandando todo mundo sair, dizendo que iam matar quem não obedecesse. Teve um ‘boca a boca’ entre os vizinhos e eles começaram a ir embora. Está muito perigoso. Até na escola tem muita gente faltando". "Eu não tinha contato com as pessoas que moravam aqui (na vila), mas como sempre passo (em frente), via todos os dias as crianças brincando, senhoras na calçada. Agora é uma vila fantasma. Cadê o governador? Cadê a Justiça? É lamentável. E não é só aqui. Onde moro eles ficam atirando meia-noite, amedrontando as pessoas. Aqui na esquina mataram um senhor que era pedreiro, porque deram a 'ordem' pra ele sair, mas ele não tinha pra onde ir. Então, vieram e mataram". "Eles chegam na madrugada, abordam o cidadão, fazem ameaças nos muros (pichações). Depois, eles vêm e invadem, armados. Você está vendo a polícia aqui? A polícia só aparece quando tem algum cadáver. A gente vive assim, com o coração na mão. Qualquer hora os caras podem chegar e dizer que querem que a gente saia daqui. E o que a gente vai fazer? Pacatuba vive um mar de terror". Veja relato de um morador da região: Morador relata cenário de medo próximo a vila onde moradores foram expulsos por facção Como está o local agora? O g1 esteve na vila abandonada durante uma manhã e tentou conversar com vizinhos do local, mas a maioria das pessoas recusou dar entrevistas por medo de represálias. Em algumas casas é possível observar a pressa dos moradores na hora de ir embora: pano de prato jogado no chão, garrafas e baldes espalhados, poeira acumulada. A vila é cercada por matagal e um rio. No fundo, uma única casa com as portas abertas traz uma placa de "Vende-se". Ao lado da placa, uma pichação com a sigla da facção GDE (Guardiões do Estado) aparece coberta por tinta branca. Durante a manhã em que a reportagem esteve na vila, nenhuma equipe da Polícia Militar apareceu para monitorar o local, mas a população afirma que à noite eles fazem uma espécie de vigília. Vila de casas em comunidade conhecida como Jacarezal, em Pacatuba (CE), ficou vazia após moradores serem expulsos por facção g1 CE Imóveis ficaram trancados e sem moradores após facção expulsar famílias em Pacatuba (CE) g1 CE Histórico de expulsões Até 2015, facções como o Primeiro Comando da Capital (PCC), de São Paulo, e Comando Vermelho, do Rio de Janeiro, já tinham presença no território cearense, mas atuavam em uma dinâmica diferente do que viriam a ter nos anos seguintes, com domínios de bairros inteiros e a imposição de pedágios, regras e controle sobre o comércio. Entre 2015 e 2016, houve o surgimento da facção cearense Guardiões do Estado (GDE), sobretudo na Região Metropolitana de Fortaleza. Com a entrada da GDE em cena, teve início uma intensa disputa pelo controle do tráfico e por territórios. Os anos seguintes foram os mais violentos do Ceará: em 2017, foram 5.133 homicídios, um recorde no estado; em 2018, foram 4.518, o segundo mais violento. Concomitante aos alarmantes números de mortes, a partir de 2015 o estado viu se aprofundar um fenômeno que segue fazendo vítimas - a expulsão de moradores de suas residências por ordens de facções. Dados da Defensoria Pública divulgados em 2018 mostravam que, àquela época, pelo menos 133 famílias - mais de 500 pessoas já haviam procurado o órgão procurando ajuda após terem sido expulsas. O g1 procurou a Defensoria para atualizar o número e foi informado de que os dados são sigilosos. Relembre alguns casos marcantes de expulsões em massa no Ceará: Infográfico - expulsão de moradores deJacarezal Arte/g1 Embora casos muitos marcantes envolvam a expulsão de dezenas de famílias, casos de expulsões de uma família ou indivíduos em específico ocorrem com frequência. Em outubro deste ano, por exemplo, criminosos picharam nas paredes de condomínio do bairro José de Alencar, em Fortaleza, informando quais moradores deveriam ir embora. Cerca de 15 dias depois, famílias de um conjunto habitacional do bairro Prefeito José Walter, em Fortaleza, foram expulsas de suas casas na última sexta-feira (10) após ameaças de facções criminosas. O que dizem as autoridades sobre a vila em Pacatuba Por meio de nota, a Polícia Militar disse que reforçou o policiamento no bairro Conjunto Jereissati III, em Pacatuba, onde está localizada a vila. Já a Polícia Civil informou que segue investigando denúncias de ameaças a moradores do bairro por meio da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco). Ninguém foi preso até o momento. O Ministério Público disse que acompanha desde setembro a situação de Jacarezal, que está sendo investigada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco ). O órgão também destacou que possui o Núcleo de Acolhimento às Vítimas de Violência (Nuavv) disponível para atender às vítimas. A Prefeitura de Pacatuba informou que “não foi procurada formalmente, por meio de nenhum canal oficial ou órgão público, por moradores que alegam ter sido expulsos de suas residências no município”. A gestão também disse que tem adotado medidas para fortalecer a segurança da cidade, dentro das competências que “cabem ao poder municipal”, como melhoria da iluminação pública e estudos para a implantação de videomonitoramento. “A gestão reforça, contudo, que as pautas relacionadas à segurança pública são de competência do Governo do Estado, responsável pela atuação das forças policiais em todo o Ceará”, disse a prefeitura. Facções buscam territórios estratégicos Mesmo uma vila pequena como a de Pacatuba pode representar um ponto de interesse para as facções criminosas por sua localização. Ao lado da rodovia CE-060, a região do Jacarezal tem uma posição privilegiada, sinônimo de fluxo de mercadorias e, portanto, mais dinheiro. Isso significa que a escolha por ocupar locais como esse não é aleatória, explica Artur Pires, professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece) e pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV) da Universidade Federal do Ceará (UFC): "Territórios próximos a portos, aeroportos e rodovias são sempre mais valorizados porque são locais de fluxo de mercadorias. Esses grupos movimentam muitas mercadorias. Locais e territórios mais densos também são mais valorizados do que outros com menos densidade. Quanto maior a densidade demográfica, supõe-se que maior a movimentação do mercado interno, de fazer o dinheiro circular. Esses grupos estão no movimento expansionista, chegando, inclusive, a distritos de pequenas cidades do interior". Pir Artur também pontua que a expulsão dos moradores nesses casos ocorre em um contexto de mudança de domínio sobre aquele território. Por exemplo: quando um território X dominado pelo CV passa a ser dominado pelo TCP, é preciso fazer uma espécie de "limpeza" para que no local não fiquem aliados da facção rival que possam "tramar traições ou dedurar situações". O problema escala porque no território vivem outras pessoas que não têm envolvimento com o crime. Elas acabam, portanto, sofrendo ameaças, agressões e até mortes. "Entram num processo de contaminação simbólica por serem parentes, amigos, conhecidos", diz Artur. Assista aos vídeos mais vistos do Ceará

FONTE: https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2025/11/02/moradores-deixam-para-tras-casas-com-moveis-e-abandonam-vila-para-fugir-de-faccoes-em-pacatuba-na-grande-fortaleza.ghtml


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